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Jorge Da Silva é cientista político. Doutor em Ciências Sociais pela UERJ e professor-adjunto / pesquisador-visitante da mesma universidade. Professor conteudista do Curso EAD de Tecnólogo em Segurança Pública (UFF - CEDERJ / CECIERJ). Criado no hoje chamado Complexo do Alemão, no Rio, serviu antes à PM, corporação em que exerceu o cargo de chefe do Estado-Maior Geral. Foi também secretário de Estado de Direitos Humanos/RJ. É vice-presidente da LEAP Brasil ('Law Enforcement Against Prohibition Brazil' (Agentes da Lei Contra a Proibição)).

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Arquivados em outubro, 2009

OLIMPÃADAS NO RIO. OPORTUNIDADE DE INTEGRAÇÃO SOCIAL III

28 de outubro, 2009    

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A PROFECIA DE ORSON WELLES

Na década de 1940 o cineasta Orson Welles esteve no Brasil para rodar um filme-documentário sobre o carnaval do Rio e os jangadeiros do Nordeste. Certo dia, teria se virado para Vinícius de Moraes, que o acompanhava pela cidade, e afirmado, a propósito das favelas e seus moradores: “É um Frankenstein, um monstro que vai se voltar contra vocêsâ€.

O filme jamais foi concluído porque, dentre outros entraves, Welles desagradou as autoridades brasileiras (Estado Novo) e setores da intelectualidade por dar ênfase a cenas com negros e favelas. O fato é que Welles teve que interromper as filmagens e nunca mais voltou ao Brasil. Eram tempos em que a sociedade carioca se via harmoniosa, com “cada coisa no seu lugarâ€, como diria Roberto Da Matta. “Arrumadaâ€. Uma perfeita democracia.

Olimpíadas de 2016. Estamos entre a integração e o aprofundamento do fosso social, pois se nota grande dificuldade de identificarmos (como facilmente identificou Welles) os reais problemas da Cidade, ou melhor, do Município… Alguém já disse que a fórmula ideal para não resolver um problema é fingir que ele não existe ou arranjar culpados (o governo, os traficantes etc.); ou fazer como o avestruz.

“Um monstro que vai se voltar contra vocês.†Se considerarmos o quadro insidioso que se formou ao longo do tempo na “cidade partidaâ€, como a viu Zuenir Ventura em 1994, e os problemas que, há mais de duas décadas, atormentam os cariocas (conflitos violentos, apartação social, morticínio, tiroteios e balas perdidas e, sobretudo, o medo coletivo), não há dúvida: descontado o epíteto “monstro”, Orson Welles foi realmente profético.

Alguém dirá: “Nada a ver uma coisa com a outra”. É…
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OLIMPÃADAS NO RIO. OPORTUNIDADE DE INTEGRAÇÃO SOCIAL II

18 de outubro, 2009    

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NOTA PRÉVIA

 

(Ontem, dia 17, no exato momento em que ia publicar este “postâ€, que acabara de redigir, eis que eclodem os confrontos na Zona Norte do Rio. Um helicóptero da PM é abatido por bandidos, com a morte de dois PMs; dez ônibus são incendiados e, no total, 12 pessoas estão mortas. Hesitei em publicar o “postâ€, pois achava que a tragédia nada tivesse a ver com o tema do “postâ€. Depois de refletir, concluí que, no fundo, tinha, razão pela qual decidi publicá-lo. Favelas, tiroteios, mortes e muros dão significado à “cidade partida ).

No “post†anterior, abaixo, falei da “cidade partidaâ€, da gafe de Gabeira, do metrô Ipanema – Barra, do quebra-quebra nos trens da SuperVia, e da idéia de as autoridades mudarem-se para o subúrbio.

Temos agora o anúncio da colocação de barreiras de proteção nas Linhas Vermelha e Amarela. Se a cidade não fosse realmente “partidaâ€, este fato não causaria tanta polêmica. Sem entrar no mérito, importa compreender as razões apresentadas para a medida, já que as autoridades se contradizem.

Lê-se em O Globo (11/10/09):

“RIO – A partir de meados de novembro, barreiras acústicas e de proteção começarão a ser construídas nas linhas Amarela e Vermelha. Módulos de 38 metros de comprimento por quase três metros de altura, confeccionados em aço, concreto e policarbonato (material transparente), serão instalados […] Paes disse ainda que a questão da segurança não foi o principal motivo para a instalação dos muros. […] O prefeito reconhece que as barreiras dão mais segurança, e reafirma que o barulho foi o principal motivo para a sua implantação. Ele também deixa claro que o objetivo não foi esconder as comunidades.â€

Lê-se ali também que “as barreiras exibirão contornos de montanhas que são ícones do Rio de Janeiro – como o Corcovado, o Pão de Açúcar, o Dois Irmãos e a Pedra da Gávea – além de pinturas que vão mostrar a cultura das comunidades locais.†A matéria só não esclarece se as imagens ficarão voltadas também para dentro das favelas.

Fica a dúvida. Afinal de contas, qual é o real objetivo dos muros?

Há oito meses, em 20/02/09, lia-se no mesmo veículo:

“RIO – A pedido do secretário estadual de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, a Linha Amarela também poderá ganhar muros na altura da Vila do João, a exemplo do que será feito pela prefeitura em três pontos de risco da Linha Vermelha. O principal objetivo dos muros de três metros de altura, em aço, concreto e acrílico, segundo a secretaria, é proteger os motoristas dos bandidos que se aproveitam de engarrafamentos para fazer arrastões. […] o projeto – noticiado por Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO – ainda está sendo detalhado pela Secretaria de Obras. […] Os muros da Linha Vermelha serão erguidos […] sendo 2.725 metros em aço (nos pontos mais próximos das favelas) e 1.300 em concreto e acrílico (nos mais distantes). […] Segundo o secretário de Obras, Luiz Guaraná, os muros servirão de proteção em eventuais tiroteios, uma vez que o aço a ser usado terá cinco milímetros de espessura.â€Â [Grifo meu]

Bem, não há por que duvidar de que a decisão das autoridades tenha decorrido mais da preocupação com o barulho que incomoda os moradores das “comunidadesâ€, e menos com a segurança, como afirmou o prefeito, ou que vise a esconder as favelas. O problema é que, no fundo, não se tem certeza de que as “barreiras acústicas†vão realmente resolver o problema do barulho; se vão ou não dificultar (é mesmo possível que facilitem…) a ação dos bandidos. Mas que vão esconder as favelas, ah!, isso vão.

 

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OLIMPÃADAS NO RIO. OPORTUNIDADE DE INTEGRAÇÃO SOCIAL I

12 de outubro, 2009    

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A escolha do Rio para sediar as Olimpíadas de 2016 é mais um importante marco na história da Cidade. Não imagino que haja um carioca sequer que não tenha vibrado no dia 2 de outubro, quando foi feito o anúncio. Pode ser que alguns brasileiros de outras cidades, por compreensíveis ciúmes, desdenhem o feito.

Cumpre reconhecer que a vitória se deve, em larga medida, à tenacidade do presidente Lula, coadjuvado pelo governador Sérgio Cabral e pelo prefeito Eduardo Paes. Com certeza, a garantia de união entre as três esferas de poder (ademais do fato de o Rio ser, indiscutivelmente, a mais bela cidade do mundo) foi fator decisivo para que os membros do Comitê Olímpico Internacional, por ampla maioria, a escolhessem.

Mãos à obra. Sete anos pela frente. O que fazer? Aí temos um ponto nevrálgico, pois várias das obras anunciadas carregam o velho vezo divisionista percebido por Zuenir Ventura em A cidade partida. A esse respeito, faço minhas, como fez Hélio Gáspari em sua coluna de 11 / 10 / 09 no jornal O Globo, as palavras do leitor Paulo Saturnino, em carta ao citado jornal, na qual comenta os distúrbios e o quebra-quebra nos trens da Super Via:

“É lamentável que ocorra um tumulto deste porte para que o lado bem vivido do Rio perceba que a Cidade Maravilhosa precisa de reparos enormes do lado pobre. Enfim, em vez de metrô para a Barra vindo de Ipanema, precisamos criar um sistema de transporte decente para o subúrbio carioca. Moro em Copacabana e vejo a pressão dos moradores da Zona Sul por metrô para a Barra próxima do imoral, em vez de criarmos um transporte decente para o subúrbio.â€

No fundo, portanto, o grande desafio é integrar os dois lados da “cidade partidaâ€: “favela e asfaltoâ€, “periferia e ‘para-cá-do-túnel’â€. Fernando Gabeira, candidato a prefeito do Município em 2008, prometeu na Zona Oeste: “O prefeito não vai morar apenas no Rio. Ele vai ter um gabinete de trabalho aqui”. O ato falho de Gabeira dá mostra do tamanho do problema. Para não incorrerem no mesmo erro, não seria o caso de se sugerir ao governador Sérgio Cabral que se mude do Leblon para a Penha? E ao prefeito Eduardo Paes, da Barra da Tijuca (ou da residência oficial na Gávea Pequena) para Madureira? E a Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, do Leblon para Marechal Hermes? Pelo menos até 2015.

Mais para refletir…

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